sexta-feira, 7 de março de 2025

Eu e só eu.

Acordo todos os dias com uma sensação pesada, um peso invisível que me pressiona o peito e me faz questionar até que ponto vale a pena continuar assim. Estou farto, completamente esgotado de tentar corresponder às expectativas de todos à minha volta. É como se vivessem para apontar o dedo, como se esperassem que eu tropeçasse apenas para confirmar aquilo que já pensam: que sou um erro, um fracasso. Só me apontam defeitos, nunca qualidades, nunca esforço.

As palavras ecoam na minha cabeça como um martelo incessante. "Tens de melhorar", "devias ser mais assim ou assado", "porque não fazes diferente?" Mas nunca perguntam como estou, nunca querem saber o que eu realmente sinto. Já não sei como explicar, porque a verdade é que ninguém me compreende. Sinto-me sozinho mesmo rodeado de pessoas. O som das suas vozes, as suas exigências, os seus olhares de censura... está tudo ali, constante, a sufocar-me. Estou cheio disto.

Não sei mais o que fazer. Tento agradar, tento mudar, tento me adaptar, mas nada parece suficiente. Gostam de mandar em mim, como se eu fosse apenas uma marioneta, como se eu não tivesse vontades, desejos ou pensamentos próprios. Qualquer escolha que faço é questionada, qualquer passo que dou é criticado. E quando finalmente tento ser eu mesmo, quando me atrevo a expressar o que quero, logo sou corrigido, podado, moldado para caber em um padrão que não é o meu.

Os dias passam e a exaustão cresce. O espelho reflete uma imagem que não reconheço mais. Quem sou eu de verdade? A pessoa que vejo ou aquela que os outros dizem que sou? Destroçado por dentro, acumulando cicatrizes invisíveis, repito para mim mesmo que devia desaparecer. Simplesmente sumir, evaporar, dissolver no ar como poeira ao vento. Talvez assim a dor parasse, talvez assim encontrasse um pouco de paz.

Andam sempre a comparar-me ao meu pai que já morreu. Cada gesto meu, cada escolha, parece ser medido à sombra do que ele foi. Mas eu não sou ele. E essa constante comparação só aumenta o peso que carrego, como se nunca pudesse ser suficiente por mim mesmo.

Sou cego e é por isso que me tratam assim. Como se a minha incapacidade de ver me tornasse menos capaz de ser eu mesmo. Como se a minha cegueira definisse quem eu sou, anulando todas as outras partes de mim. Cada passo que dou é analisado, cada erro amplificado, cada tentativa de independência questionada. Não me veem como um indivíduo, apenas como uma limitação ambulante.

Mas ainda estou aqui. Carregando essa avalanche de emoções confusas, tentando sobreviver mais um dia. Tenho muitos defeitos, é verdade, mas não sou apenas isso. Não posso ser apenas isso. Preciso encontrar uma forma de me libertar, de ser eu mesmo sem medo, sem cobranças, sem esse peso esmagador. Talvez um dia consiga. Talvez um dia eles finalmente vejam que sou mais do que os erros que cometem em me apontar.

E se não virem, não faz mal. Porque o mais importante é que eu mesmo veja. Veja que sou suficiente, que tenho valor, que mereço espaço neste mundo do jeito que sou. Não preciso da aceitação de todos, apenas da minha própria. E a partir de hoje, vou tentar dar esse primeiro passo para mim mesmo. 


Marciel


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